sexta-feira, 4 de abril de 2008

Piolin


MANOELA MARIA VALÉRIO
TIAGO CASSOLI

Sob a lona de um circo armado na cidade de Ribeirão Preto nasceu Abelardo Pinto, o palhaço Piolin, no dia 27 de março de 1897. Piolin encantou o público de sua época e foi, na efervescência de 1922, incorporado ao movimento modernista como um grande artista da cultura brasileira. Oswald de Andrade, Mário de Andrade, Tarsila do Amaral, dentre outros, foram alguns de seus assíduos espectadores e amigos. Rendendo homenagem a Piolin, comemora-se o dia 27 de março como dia do circo.
E agora, o circo morreu? Não! Eis a mais antiga novidade: o circo é vivo e transforma-se, transmuta-se em milhões de formas, habita o passado e o futuro, é presente! Esquenta as praças e faz vibrar os corações da cidade! De saltimbancos medievais aos circos modernos do século XVIII, de circo pequeno ao grande, dos esquecidos aos sempre lembrados, venerados, o circo vive e há tempos que, todo dia é dia de circo.
Atentemos, no entanto, para os pequenos circos que percorrem nossas cidadezinhas. Estes são constituídos por um grupo familiar que não se pauta unicamente em vínculos consanguínios mas por pessoas que possuem, sob a lona, uma relação singular de trabalho, de educação, de transmissão da arte circense de geração para geração, possibilitando práticas muito diferenciadas dentro da nossa cultura.
Nestes circos encontramos a montagem de um espetáculo dividido em duas partes; na primeira, números variados de risco e de superação de limites corporais, como; o malabarismo, as acrobacias aéreas e de solo, os números de equilíbrio, o contorcionismo, a pirofagia, intercalados por esquetes e reprises da figura principal do espetáculo; os palhaços. Na segunda parte alguns circos exibem do mesmo modo os números de variedades, mas outros circos levam para o público um espetáculo de teatro com peças do repertório circense. Lembrando que a pausa do espetáculo é o momento em que os artistas vestem-se de vendedores de pipoca, maçã do amor, churros, pastel, guloseimas clássicas do universo circense.
Há mais de cem anos a passagem destes circos pelas cidades vem contribuindo para a produção e disseminação da cultura em nosso país. Cumpre, assim, um papel social fundamental para a população das cidades interioranas onde a circulação artística geralmente é escassa e que não são, em sua maioria, contempladas pelas políticas públicas culturais fomentadas pelos governos.
Entretanto, o circo itinerante tem a estrada como trajeto de seu trabalho, deste modo, para chegar de um ponto a outro, ou seja, de uma para outra cidade, tem que pagar taxas por todos os carros, trailers, caminhões, o que acaba por comprometer essa circulação. E então, quando chega numa localidade é cobrado a pagar para as diversas instâncias: prefeitura, corpo de bombeiros, aluguel de terreno, autorizações de polícia, etc. Por estas razões muitos circos não são autorizados a entrar em algumas cidades sem o prévio pagamento de alvarás ou pelo fato ainda de terem animais em seu espetáculo. Ocorre que cada município ou estado têm leis próprias variando as exigências oficiais para a entrada do circo na cidade, ficando assim ao sabor das circunstâncias, muitas vezes desfavoráveis, configuradas em sua chegada ao local.
Tais questões somam-se a um conjunto de fatores, dentre eles o surgimento da televisão que acabou assumindo o lugar de principal veículo de comunicação e difusão da cultura, antes realizado pelo circo e posteriormente também pelo rádio. Esses são alguns dos sérios motivos pelos quais essas famílias vêm enfrentando dificuldades para sobreviver e que contribuem para diminuir a circulação destes espetáculos pelo país.
Torna-se urgente a necessidade de pensarmos políticas públicas de incentivo e proteção deste veículo cultural imprescindível às cidades, em especial do interior, que muitas vezes têm no circo umas das raras possibilidades de experienciar uma obra de arte. O circo aqui tratado cumpre um papel social precioso para a sociedade e esta cumprirá com suas responsabilidades ao tomá-lo como patrimônio cultural que necessita de políticas públicas de incentivo e proteção.
Quiçá os outros tantos dias do ano sejam festejados com os tantos palhaços, trapezistas, acrobatas, malabaristas, artistas que levam esta arte aos picadeiros, palcos, ruas, ao interior, às capitais, à vida das cidades, aos corações, um brinde à alegria! E ao público! Eis que há de ser saboroso, neste acontecimento, o brinde ao encontro circense!
Manoela Maria Valério, integra a Equipe CIRCUS e realizou mestrado em Psicologia na Universidade Federal Fluminense RJ, com o tema das artes circenses.
Tiago Cassoli é doutorando de Pós-graduação em Psicologia da Unesp de Assis. Autor da dissertação de mestrado pela Universidade Federal Fluminense, Do perigo das ruas ao risco do picadeiro.

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